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António Maria de Oliveira Bello – Olleboma

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António Maria de Oliveira Bello – Olleboma
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Cozinha com Historia
António Maria de Oliveira Bello – Olleboma
Texto Cozinha com Historia

António Maria de Oliveira Bello, mais conhecido pelo pseudónimo Olleboma, não nasceu nem viveu em Cascais, mas a sua ligação gastronómica à vila é inegável e duradoura. Vamos começar pelo início. Olleboma, um pseudónimo que resulta das iniciais do seu nome lidas ao contrário: OLLEB de Bello, O de Oliveira, M de Maria e A de António, nasceu em Lisboa a 31 de maio de 1872 e é lembrado como um dos mais conceituados gastrónomos portugueses e um fervoroso promotor da culinária nacional.

Formado pelo antigo Instituto Superior do Comércio e vindo de uma família de industriais abastados do setor moageiro, foi naturalmente levado a participar ativamente no mundo industrial e comercial, ocupando vários cargos ao longo da sua vida. Paralelamente, envolveu-se em atividades políticas, tendo uma posição conservadora e militando no Partido Regenerador Liberal de João Franco entre 1907 e 1908. Após o regicídio, afastou-se da política, mas regressou em 1918 ao Parlamento, durante o governo de Sidónio Pais, como representante da Associação Comercial no Conselho Superior Económico. No entanto, não se deixou seduzir pelos cargos políticos, recusando o convite para ser Ministro das Finanças após o golpe de 28 de maio de 1926, cedendo o lugar a António de Oliveira Salazar.

Infelizmente, uma queda acidental na sua casa em Lisboa, no verão de 1935, levou ao seu falecimento poucos meses depois, em outubro desse ano. Apesar da sua morte prematura, o seu contributo como membro da Sociedade de Propaganda de Portugal e do Conselho Internacional de Turismo reflete-se na sua obra gastronómica e na sua atuação como membro fundador da Sociedade Portuguesa de Gastronomia, deixando ao país uma obra fundamental para a cozinha nacional. Esta sociedade, fundada no início de 1933, publicou os seus estatutos em 1934 no Almanaque Lello, pela Livraria Lello, do Porto, incluindo um texto aprofundado de Olleboma sobre a história e finalidade das sociedades de gastronomia. Com o objetivo de promover o turismo nacional ancorado na gastronomia e enaltecendo os melhores vinhos, os estatutos destacam a importância de valorizar a cozinha nacional, melhorando-a e elevando-a ao lugar que merece, defendendo a cozinha regional e os produtos alimentares portugueses de alta qualidade.

A produção editorial de António de Oliveira Bello começou em 1928 com uma obra magistral intitulada "Culinária", com mais de 750 páginas repletas de receitas influenciadas pela cozinha francesa, que o autor considerava, na nota prefacial, a mais perfeita, artística e higiénica. No final da sua vida, escreveu ainda um texto importante para o I Congresso Nacional de Turismo, lido pelo seu filho António, uma vez que faleceu antes do evento. "A Culinária Portuguesa e o Turismo", foi integrado como preâmbulo na sua obra mais extensa, "Culinária Portuguesa". A edição de autor, teve a primeira edição em 1936, seguida de várias reimpressões. Com prólogo do amigo Albino Forjaz de Sampaio, as receitas revelam com precisão uma parte significativa do património culinário português, sendo um dos primeiros levantamentos e repositórios do receituário tradicional nacional. Olleboma compilou um vasto conjunto de receitas que se distingue pela apresentação inédita do receituário português, destacando a matriz nacional, regional e colonial, subsidiária do espírito nacionalista promovido pelas políticas de valorização do turismo e diversidade regional lideradas por António Ferro e o seu ambicioso Secretariado de Propaganda Nacional.

Numa abordagem que contempla os diversos eixos gastronómicos, o autor evidenciou os enormes recursos naturais de Portugal e, neste contexto, elevou a categoria da produção vinícola nacional, mencionando as diferentes regiões, algumas de alcance mundial, sem esquecer o licoroso de Carcavelos que descreveu como tendo "qualidades especiais de aveludado aroma e sabor característico e inconfundível. É um vinho enérgico e excitante das papilas da língua".

O epicurista considerava que, além de outras categorias, os pratos de pescado revelavam a matriz nacional, destacando-se as receitas de "mexilhão de caldeirada à fragateira", “sardas ou cavalas salgadas cozidas em leiteassociadas a Cascais, bem como a "salada de lagosta à moda de Cascais", sendo esta a primeira obra de culinária impressa a especificar inequivocamente a ligação a esta vila histórica portuguesa. As três receitas encontram-se reproduzidas no livro Receitas de Reis e Pescadores[1].

 

[1] MOREIRA, Raquel, MATALOTO, Cláudia, Silva, Receitas de Reis e Pescadores, Câmara Municipal de Cascais | Casa das Letras, 2017.