Carlos Augusto Bonvalot (1893–1934) é uma figura marcante da pintura portuguesa do início do século XX. Nascido em Paço de Arcos, viveu e trabalhou em Cascais, onde encontrou o cenário ideal para desenvolver uma obra marcada pela intimidade, pelo realismo e pela observação sensível da vida quotidiana. Pintor e conservador-restaurador, foi também pioneiro na utilização de técnicas de exame radiográfico em obras de arte, revelando uma abordagem científica e inovadora à conservação patrimonial.
A sua pintura distingue-se por retratos de natureza intimista, cenas familiares e representações realistas das gentes do mar, dos recantos típicos da vila e da vida doméstica. Cascais surge como protagonista silenciosa nas suas telas: não apenas como paisagem, mas como território afetivo, onde se cruzam memórias, gestos e rotinas. Bonvalot captou com delicadeza os rostos dos pescadores, os interiores das casas, os jardins e as ruas da vila, revelando uma estética da proximidade e da contemplação.
Carlos Bonvalot faleceu precocemente, aos 40 anos, em Cascais, deixando uma obra que continua a inspirar artistas e historiadores da arte. A sua pintura, feita de luz natural, de silêncios e de gestos quotidianos, é um testemunho da vida em Cascais nas primeiras décadas do século XX — uma vida feita de trabalho, de contemplação e de beleza discreta.
Entre as suas obras mais evocativas encontra-se Suzana Bonvalot – Mulher do artista com coelho, um retrato circular onde a figura feminina se apresenta serena, segurando um coelho com ternura. A composição, de grande sobriedade cromática e delicadeza formal, remete para o universo doméstico e afetivo que atravessa a obra de Bonvalot. O coelho, símbolo de fertilidade, de vida rural e de alimento tradicional, torna-se aqui um elo entre a pintura e a cultura gastronómica portuguesa.
Para homenagear este pintor da intimidade e da luz, sugerimos uma receita retirada do livro Receitas de Reis e Pescadores, editado pelo Município de Cascais: Coelho Frito, prato de tradição popular, simples e saboroso, que evoca os sabores da terra e da casa. A ligação entre a obra pictórica e a receita é direta — o coelho como figura central da tela e como ingrediente de uma cozinha afetiva, feita de gestos antigos e sabores persistentes.