A gastronomia de Cascais reúne a diversidade do território e das pessoas, onde se destacam a população fixada desde há séculos e os grupos migratórios oriundos de outras regiões do país ou de outros países. Pescadores provenientes do Algarve e da Beira Litoral, pedreiros e agricultores das Beiras, do Alentejo e de Trás-os- Montes e também a Corte Portuguesa no final do século XIX e várias Casas Reais Europeias, durante a II Guerra Mundial. São estas pessoas que que contribuíram com os seus saberes para fazer de Cascais, uma terra de Reis e Pescadores e também de Saloios, à mesa.
Entre os pratos mais tradicionais, que privilegiam os produtos locais, destacam-se as sopas e caldos, os peixes e mariscos, os pratos de carne com predominância dos pratos de capoeira e caça e os doces, bolos e bolinhos, de origem conventual e popular. Comer em Cascais pode traduzir-se numa experiência de viagem pelo seu território, história e património, do litoral ao interior, onde os sabores da serra e do mar caracterizam a sua gastronomia e onde se perpetuam as tradições, os sabores e cheiros da terra.
Quando, em 1364, D. Pedro I elevou a aldeia de Cascais à categoria de vila, já os seus habitantes asseguravam parte do abastecimento de peixe à cidade de Lisboa e a exportação por via marítima das produções agrícolas de uma área que se estendia até Sintra, fazendo decerto bom uso das excelentes matérias-primas da região, em receitas culinárias que apesar de não registadas por escrito souberam passar de geração em geração.
Também o Foral de 1514 e o livro de posturas quinhentistas de Cascais atestam a riqueza dos produtos da terra e do mar que sempre estiveram ao dispor dos habitantes de um concelho que ao longo de séculos encontrou na agricultura e na pesca a sua força motriz, erigindo, assim, os saloios e os pescadores enquanto figuras centrais de uma história coletiva. Ainda hoje os cascalenses recordam, com saudade, a chegada dos homens do mar, descarregando o peixe na praia, momento a que se seguia a venda pelas ruas de Cascais, a cargo das peixeiras, que por vezes descalças, com canastras à cabeça, sogra ou rodilha, algibeira e avental chamavam os compradores à porta dizendo “Olha a sardinha! É viva da costa! Venha cá freguesa!”
Não obstante a produção agrícola não suprir as necessidades de consumo internas – pois nem a lavra do trigo, a mais significativa do concelho, satisfazia a procura, o mesmo sucedendo com a da cevada, da aveia e do centeio – as poucas hortas existentes, quase sempre instaladas em quintas, perto dos vales mais frescos, dispunham de frondosos pomares, em que abundavam abrunheiros, alperceiros, amendoeiras, figueiras, laranjeiras, limoeiros, macieiras, nespereiras, nogueiras, oliveiras, pereiras, pessegueiros, romãzeiras e tangerineiras, cujos frutos seriam integrados nas receitas locais.
A vinha constituía, ainda assim, a cultura mais emblemática do concelho, pela fama do vinho de Carcavelos, cuja produção se concentrava nas colinas suaves de Carcavelos a Caparide e seria sabiamente utilizado na confeção de diversas iguarias.
O Vinho de Carcavelos foi, e ainda é, um produto vinícola de excelência. A antiguidade deste precioso néctar encontra-se comprovada num Alvará de 1772, depositado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, que protegia a viticultura de Carcavelos e mandava elevar os preços do vinho devido à sua qualidade, ainda que existam registos da exportação de Carcavelos proveniente da Quinta dos Padres Jesuítas de Carcavelos, para Inglaterra, no século XVII. De acordo com documentação da época, o Carcavelos terá mesmo atingido uma produção de três mil pipas no início do século XIX, em resultado do significativo volume de exportação para este país.
A ocorrência de duas terríveis pragas, de oídio em 1866, e de filoxera em 1876, viriam a prejudicar consideravelmente a produção obstando à afirmação deste vinho face a produtos similares como o Porto e o Madeira. A recuperação da produção do vinho de Carcavelos foi lenta e a grande procura do Vinho de Carcavelos levou à sua falsificação, no século XIX, por produtores de outras regiões, e a um correspondente desprestígio da “marca”. De forma a garantir a qualidade da produção, a 18 de setembro de 1908 foi emitida uma Carta de Lei que lhe conferia a designação de vinho generoso e determinava a demarcação da região de Carcavelos às freguesias de São Domingos de Rana, Carcavelos e a parte da freguesia de Oeiras
Há quem diga que Cascais não possui doçaria típica, tradicional da terra, excetuando, talvez, as célebres areias e as nozes de Cascais. Tal ideia será certamente contrariada pelos cascalenses mais antigos, que ainda guardam consigo memórias da Fábrica de Bolos de Cascais, da Casa Faz-Tudo ou da Casa Tavares, onde se fabricavam, por exemplo, as joaninhas, feitas de amêndoa, ovos e açúcar, que remontam pelo menos ao final do século XIX. Mas também os bolos reais – porque eram feitos (e muito apreciados) para o rei D. Carlos -, as pratas, as areias – consideradas bolos “de ricos”, às quais se contrapunham os bolos de banha, uma receita mais humilde e de consumo frequente entre os pescadores. Assim, se confirmar que a doçaria cascalense é de uma grande variedade, das receitas conventuais às populares, os bolos, bolinhos e doces de Cascais vai mais além das "famosas" areias e nozes. Em casa e também no comércio local, encontram-se outras iguarias, mantendo a tradição do açúcar, do mel, das amêndoas, dos figos, laranjas e limões e tantos outros ingredientes que caracterizam a doçaria local.
Nas sopas destaca-se a utilização de batata, leguminosas, nabo e tomate. Muito presente é também o pão, a carne ou peixe e enchidos que as encorparam e lhes conferem um sabor genuíno.
As espécies capturadas nas águas de Cascais são vendidas na Lota e no Mercado da Vila e, posteriormente, utilizadas na cozinha local, sendo as mais expressivas a sardinha, o carapau e o polvo. Os peixes e mariscos mais nobres também fazem parte da gastronomia local, como a garoupa, o robalo, o tamboril, a moreia, a lagosta, a santola, o berbigão, o mexilhão entre outras espécies. Incontornável é a presença do bacalhau, dada a sua relevância e tradição na alimentação portuguesa, constituindo um traço de identidade gastronómica e cultural do nosso povo.
O consumo de carne no concelho está ainda muito associado à capoeira e caça. À galinha corada no forno, que se come em dias de festa, ou a canja de galinha ou perdiz que faz as delícias dos mais novos, juntam-se os pratos de caça, que constituía um importante recurso das populações interiores do concelho, onde predomina o coelho, a lebre e a perdiz. Também na ementa real, a caça era comum, dado o apreço que os Reis D. Luís e seu filho, D. Carlos, tinham por esta atividade. A presença do consumo da carne de porco confirma-se nos enchidos e em alguns pratos mais tradicionais, como a Carne de Alguidar.
Em 2017, ciente da importância da preservação e divulgação do património imaterial do concelho, a Autarquia constituiu um repositório de parte substancial deste património através da publicação do livro “Receitas de Reis e Pescadores”, disponível a todos que o queiram conhecer e experienciar.